Paula Ferreira
Published in 2024
Quantos cavalos são necessários para mudar o mundo? subverte, através da linguagem lúdica, símbolos relacionados com a ideia de poder. Composta por dois paineis de desenhos que se defrontam, a instalação arquiteta um espaço de passagem para o público. A partir de um padrão axadrezado, há uma contraposição de situações antagônicas que se divide em “casas” de cores opostas — uma perspectiva metafórica que remonta a maneira com que, tanto na vida quanto nos jogos de tabuleiro, a sorte, ou o azar, podem ser definidos pela aleatoriedade de um lance de dados.
Em uma correspondência dialógica com a iconografia ocidental, é a partir da imagem do cavalo e do pedestal que a obra formula uma sátira sobre as estruturas que organizam social e ideologicamente a vida contemporânea (o trabalho, a prisão, a escola, etc). Tradicionalmente relacionados com os imaginários acerca da dominação, do heroísmo, da autoridade e da força ostensiva, os cavalos representados surgem libertos de tais conotações. São figuras que, atribuídas a uma condição quase humana, exercem um conjunto de atividades que, na realidade contemporânea, pertencem ou à esfera privilegiada do lazer, ou àquela desprivilegiada dos infortúnios.
Ao dançar enquanto tocam pandeiro, se banhar em fontes caudalosas e imitar fantasmas como as crianças fazem com lençois, os cavalos retratados nas casas brancas contrapõem aqueles que povoam as casas pretas, os quais enfrentam mares revoltosos, naufragam em navios e padecem em futuros obscuros. Apontando para o absurdo da existência e das ordens que a condicionam, para o jogo enquanto espaço de crítica social e para a fragilidade de um presente cada dia mais polarizado e fragmentado, o trabalho propõe uma reflexão crítica.
Em referência à anedota popularmente conhecida, Quantos cavalos são necessários para mudar o mundo? abrange a representação de situações mundanas que se contrastam, para questionar a ideia de liberdade individual e coletiva, relembrar a iminente ameaça de violência que paira sobre as sociedades contemporâneas e desafiar a arbitrariedade que permeia a existência humana.
A obra foi comissionada pela 5a edição de Anozero - Bienal de Coimbra, O Fantasma da Liberdade, com curadoria de Ángel Calvo Ulloa e Marta Mestre, com o apoio da Mondriaan Fonds.
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